quinta-feira, 7 de maio de 2015



Para a história do "Cromeleque do Xerez"

O Cromeleque do Xerez, ainda na sua localização resultante do restauro de Pires Gonçalves, na Herdade do Xerez. Toda esta área encontra-se actualmente submersa
Em recente entrada para este Blog referi a actual situação do "remontado" Cromeleque do Xerez e recordei as circunstancias decorrentes dos trabalhos arqueológicos realizados no Alqueva que estiveram na origem daquela que foi a única "transposição" de um monumento arqueológico ensaiada no âmbito daquele projecto. Poderíamos referir a situação da antiga Igreja da Luz (e valerá a pena um dia recordar esse tema) mas nesse caso, assistimos à construção de um "pastiche", a que se agregaram alguns elementos recuperados da igreja antiga, entretanto demolida. Volto ao tema do Cromeleque, porque reencontrei um delicioso texto do Professor Raul Miguel Rosado Fernandes que, com a devida vénia, não resisto em reproduzir na íntegra, até porque o original, constando de um livro de 2009 de homenagem ao Professor Doutor Mário de Albuquerque, não deve ser muito acessível para arqueólogos. Rosado Fernandes, conhecido do grande público por ter sido a certa altura dirigente da CAP (Confederação dos Agricultores Portugueses) foi até à construção da Barragem do Alqueva proprietário da Herdade do Xerez, que coincidia em parte com uma uma extensa bacia na margem direita do Guadiana, a Sul de Monsaraz, a qual pelas suas características e localização, se revelou como um verdadeiro "palimpsesto" pré-histórico. Para além do Cromeleque e outros menires avulsos identificados por Pires Gonçalves e da Anta do Xerez, referenciada pelos Leisner como bem refere no texto, os trabalhos associados ao Alqueva aí levaram à identificação de uma miríade de vestígios de ocupações humanas pré-históricas, obrigando a uma especial concentração nesta área de acções de investigação. De entre os sítios mais importantes aqui referenciados, recordamos ainda o acampamento epipaleolítico da Barca do Xerez ou o habitat do neolítico antigo do Xerez 12, onde foram descobertos e escavados vários fornos culinários. Foi precisamente a descoberta do sítio da Barca do Xerez que motivou uma visita a esta Herdade, algures no início de 1998, da Comissão Científica instituída pela EDIA para acompanhamento dos trabalhos arqueológicos do Alqueva. Esta integrava os arqueólogos Luis Raposo, Vitor Oliveira Jorge e Jorge Alarcão, a historiadora Maria José Ferro e o Arquitecto Pedro Fialho (já falecido), académicos quase todos conhecidos de Rosado Fernandes, ele próprio Catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Recordo bem o momento em que alertado pela passagem de várias viaturas no casario do Monte do Xerez de Baixo, Rosado Fernandes apareceu em fato de macaco que já conhecera melhores dias, e de como, ao reconhecer tantos e distintos colegas, citou Tolstoi, ironizando com a sua desajeitada indumentária rural. No texto que aqui divulgo, Rosado Fernandes dá conta das circunstancias da descoberta dos menires do Xerez, relatando e comentando a reconstituição feita por Pires Gonçalves e reflectindo, sem ser arqueólogo, sobre as dificuldades e armadilhas da produção do conhecimento nesta área. De facto, apesar das novas escavações conduzidas na altura por Mário Varela Gomes terem sido inconclusivas no que respeita á forma original do monumento, foi (quase) consensual a decisão tomada de se respeitar o quadrilátero proposto por Pires Gonçalves, na reconstituição feita anos mais tarde na Orada de Monsaraz. Afinal, os arqueólogos devem ser os primeiros a lembrar que os sítios e os monumentos arqueológicos, são antes de mais uma "construção", quantas vezes meramente plausível, dos seus descobridores, que ao escavarem ou restaurarem fazem opções, quantas vezes condicionadas pela sua formação, experiência ou mesmo pelas suas obsessões...
Visita os membros da Comissão científica de acompanhamento dos trabalhos arqueológicos do Alqueva, acompanhados por outros arqueólogos, à  Herdade do Xerez onde se havia localizado o acampamento epipaleolítico da Barca do Xerez (1998)



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