segunda-feira, 30 de novembro de 2015

NO PENEDO DO LEXIM, HÁ 40 ANOS


O "link" que alguém deixou no Facebook, falava no Penedo do Lexim há 5 000 anos, remetendo para uma nota publicada  no Jornal de Mafra. http://jornaldemafra.pt/mafra-na-pre-historia-penedo-do-lexim/. As minhas memórias não vão tão longe mas começam a ganhar alguma patine. Parafraseando as experiencias por que todos os arqueólogos passaram um dia, entrevistando a população local sobre a possível idade dos vestígios..."pois é meu amigo, isso deve ser mesmo muito antigo; eu já tenho 80, o meu pai morreu com quase noventa, e sempre lhe ouvi falar disso..."
Neste caso a notícia remeteu-me para eventos de 75, do tal Verão quente, onde tudo podia acontecer. José Morais Arnaud, então assistente convidado da Faculdade de Letras, para onde entrara apenas no ano lectivo de 74/75, por justificadissima exigência dos próprios alunos, foi meu professor no último ano do meu curso (1970-75) com uma cadeira prática sobre "métodos e materiais arqueológicos", também uma novidade nesses tempos em que a arqueologia se aprendia apenas nos bancos da Faculdade e em 2 ou 3 cadeiras teóricas... Após alguns meses atribulados de aulas, ao sabor da ebulição política da época, o Zé, como todos o tratávamos, resolveu concluir a nova cadeira com o envolvimento dos alunos (julgo que obrigatório para a avaliação final) numa escavação prática, à imagem do que estava então em voga em França ("chantier-école"). Selecionou para isso, o que restava do povoado calcolítico do Penedo do Lexim, um sítio já então muito afectado pela laboração duma pedreira de basalto e onde chegara a fazer em 1970 uma sondagem de "emergência" com Vasco Salgado de Oliveira e Vitor Oliveira Jorge. Os antecedentes historiográficos deste importante sítio podem recordar-se em Ana Catarina de Sousa,   http://www.patrimoniocultural.pt/media/uploads/trabalhosdearqueologia/11/Umaintroducaoahistoriadaactividadearqueologicanaareaemestudo.pdf, arqueóloga que, algumas décadas depois ao serviço da Câmara Municipal de Mafra aqui retomaria a investigação. Em todo o caso refira-se que o sítio era conhecido desde Estácio da Veiga e Leite de Vasconcelos, quer pelo seu interesse geológico ( o Penedo do Lexim apresenta-se com formações basálticas prismáticas muito peculiares) quer pelo seu inegável interesse arqueológico enquanto "ppovoado Calcolítico". 

A campanha teve lugar durante mês de Setembro de 1975. Falhei o início por uns dias, porque os trabalhos coincidiram com a data do meu casamento, ocorrido no final de Agosto. Mas uma semana depois e graças a uma "carreira" da velha Mafrense que passava na Amadora vinda de Lisboa em direcção a Mafra, lá desci, de mochila às costas, junto à velha e apertada ponte de Cheleiros, seguindo depois, a pé durante alguns quilómetros, até ao local da antiga pedreira, o acampamento base da escavação. As condições de estadia e trabalho, não podiam ser piores. A maior parte dos estudantes (quase todos seguiriam carreiras profissionais ligadas à arqueologia e à museologia, ainda que por vezes apoiadas no ensino secundário ou superior) estavam instalados numa velha casa agrícola, sem electricidade e praticamente sem portas e janelas (e sem estruturas sanitárias de qualquer espécie) que servia de apoio logístico (comida, dormida e trabalho de gabinete). O afastamento em relação à aldeia de Cheleiros, levantava problemas no abastecimento de víveres, confecionados à vez pelos membros da equipa. Valia-nos como únicos luxos a disponibilidade do velho Land Rover da Faculdade de Letras para as compras na aldeia e uma fonte próxima onde, à vez, fazíamos a higiene da manhã. Mesmo para aqueles de nós que tinham já alguma experiencia de campo (sobretudo os que desde 1971 participavam nas campanhas do Tejo), as condições logísticas eram excessivamente precárias, agravadas pelas difíceis condições de trabalho. O vento habitual nestas paragens, envolvia permanentemente a escavação numa nuvem de poeira intragável. Em todo o caso, julgo que todos os que tiveram oportunidade de participar estarão de acordo com aquilo que consigo recordar. Um tempo de plena entrega ao puro prazer da arqueologia pela arqueologia, ainda sem qualquer subterfúgio ou segundas intenções carreirísticas...As imagens que anexo, são o que consegui reunir no meio do meu anárquico arquivo pessoal. Estão longe de reflectir quer as condições locais quer a totalidade dos colegas envolvidos (julgo que duas ou três dezenas). Passaria ainda algumas vezes por Cheleiros, a caminho do Convento de Mafra (que se vê magnificamente a Norte do Penedo do Lexim), onde pouco tempo depois destes eventos, fiz a recruta no serviço militar. Mais tarde, já como arqueólogo profissional ao serviço do IPPC, passei por perto, revendo as inscrições romanas em tempos incrustadas na Igreja Matriz de Cheleiros, e apreciando em detalhe a Ponte vizinha, como todas as pontes antigas deste país, atribuída aos "romanos". Mas nunca mais tive coragem de subir ao velho Castro. Felizmente, uma arqueóloga já de outra geração, cujo trabalho "megalítico" acompanhei de perto no Projecto do Alqueva, resolveu anos mais tarde repegar no sítio, com o sucesso que ainda hoje se reflecte nas notícias que nos chegam de Mafra.


À esquerda o António Martinho Baptista (actual Director do Museu do Côa) e o Rui Parreira (Director de Bens Culturais no Algarve), num intervalo do desenho de estruturas, discutem com Cardim Ribeiro (durante muitos anos responsável pelo património cultural na Câmara de Sintra e fundador do actual Museu de Odrinhas). Em segundo plano uma colega que não consigo identificar

Ao centro o José Morais Arnaud, fala com Francisco Sande Lemos, à esquerda (arqueólogo e investigador hoje aposentado da Universidade do Minho) e António Brazão, que exerceu o ensino durante anos em Alter do Chão (dirigiu escavações no sítio romano do Ferragial d'El Rei no início dos anos 80). Em primeiro plano, agachado, João Ludgero, durante muitos anos arqueólogo ao serviço da Junta Distrital de Lisboa.


Num intervalo dos trabalhos de campo: da esquerda Isabel Costeira (antiga Directora do Mosteiro de Alcobaça) e Rui Parreira. À direita, em cima António Martinho Baptista e Sande Lemos. Em primeiro colega, uma colega que não consigo identificar.
O velho Land Rover da Faculdade de Letras usado nas escavações do Lexim. O Sande Lemos, "a cavalo" e a Isabel Silva

Ao final do dia, actuação do "Alegre", alcunha do autor deste Blog, (ver a propósito o post anterior
http://pedrastalhas.blogspot.pt/2015/01/o-alegre-do-rodao-ao-ler-no-ultimo-n-do.html) nas magníficas instalações de apoio às escavações. Reconheço ao centro da foto, a Teresa Marques (actualmente aposentada depois de toda uma carreira no IPPC/IPPAR) e ladeada, suponho, pela Clara Vaz Pinto (com uma longa carreira ligada sobretudo aos Museus).


Ainda no Penedo do Lexim, 1975- Reconheço a Manuela Martins e a Isabel Costeira à esquerda. O Francisco Sande Lemos, de óculos e à direita, com a sua imagem de marca da época, o António Martinho Baptista








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