segunda-feira, 21 de novembro de 2016

AS PEDRAS TALHAS DOS ALMENDRES

nas memórias dos mais velhos


Recentemente a União de Freguesias da Tourega e de Guadalupe, estrutura administrativa que abrange um território conhecido pela sua riqueza megalítica, única em todo o país, promoveu a gravação dos depoimentos de três dos seus habitantes, visando o registo das suas memórias pessoais sobre o Cromelque dos Almendres, ou "Alto das Pedras Talhas", como localmente era conhecido. Com efeito, a identificação arqueológica dos Almendres, apenas aconteceria em 1964 quando o local foi visitado pela primeira vez por Henrique Leonor de Pina, conduzido pelo guarda da Mitra "António Gadunhas", um "verdadeiro camponês arqueólogo", nas palavras do próprio Pina. A divulgação científica aconteceria alguns anos mais tarde, no II Congresso Nacional de Arqueologia que teve lugar em 1971 na cidade de Coimbra.

À data daquele reconhecimento, já todos os três entrevistados eram homens adultos, residentes em Guadalupe e interessava-nos ouvir as suas próprias experiências relativamente ao "antes", ao "durante" e ao "depois". Com efeito o Ti Bento Rosa Calhau, nascido em 1936 na Torre dos Coelheiros, viria ainda criança para a Herdade dos Almendres, onde fez de tudo um pouco como "jornaleiro". É o único sobrevivente do trio de trabalhadores (integrado também por Jacinto Samina, do Monte das Pedras e António Canaverde, da Boa Fé) que por volta de 1959, às ordens e sob a orientação do proprietário da Herdade, Eng. Miguel Soares, procedeu aos primeiros levantamentos de menires no Cromeleque. Ainda que sem qualquer enquadramento científico, presume-se que às motivações de Miguel Soares, estaria já subjacente algum reconhecimento empírico da natureza pré-histórica do local. Cruzando várias informações, incluindo entrevista realizada em 2014 com o Ti Bento, o malogrado arqueólogo Pedro Alvim (falecido em 2015), chegara à conclusão que aqueles trabalhos de 1959, incidindo sobre menires semitombados e realizados apenas com meios tradicionais e força humana, não terão desvirtuado no essencial, a estrutura básica do monumento, posteriormente completada com os trabalhos arqueológicos de Mário Varela Gomes.





Sobre Joaquim Feliz Casquinha, mais conhecido por Joaquim Cristéta, já aqui tinhamos deixado anterior notícia ( http://pedrastalhas.blogspot.pt/2016/11/o-ti-cristeta-e-as-pedras-talhas.html ). Nascido em 1925, é o mais idoso dos três entrevistados. Já aposentado de uma longa vida de trabalhador rural, foi um entusiástico colaborador nas escavações realizadas nos anos oitenta no Cromeleque e dirigidas por Mário Varela Gomes, com a colaboração de Francisco Serpa. Era importante registar o seu testemunho pessoal sobre essa sua experiência, que inclui até algumas "quadras" dedicadas ao Cromeleque.




Por fim, seria também importante recolher o testemunho de Manuel Estevão, nascido em 1935 no Monte da Pedreira, ao Escoural. Tal como os outros entrevistados, Manuel Estevão trabalhou desde criança na agricultura, onde fez de tudo um pouco. Ainda jovem já era pastor mas a dureza daquela vida ("estava meses sem poder ir a casa") levaram-no a procurar outros trabalhos após o serviço militar. Viria a especializar-se como "canteiro", profissão que chegou a exercer na emigração. No entanto seria como funcionário da pedreira municipal da Fiúza (Évora) que viria a ser chamado no final dos anos 80 para colaborar nos grandes trabalhos de restauro coordenados por Mário Varela Gomes e promovidos pela autarquia eborense (na altura a Herdade dos Almendres estava ainda integrada na UCP de Guadalupe). À sua experiencia e conhecimento técnico se ficou a dever não apenas a reerecção de diversos menires mas também a remontagem e colagem de alguns que se encontravam partidos. Reconhecida a qualidade do seu trabalho, viria a colaborar também no restauro do vizinho Cromeleque da Portela de Mogos, e mais tarde, há cerca de duas décadas, na delicada operação de remontagem do gigantesco menir de Meadas em Castelo de Vide. Interessava pois também gravar as suas memórias pessoais das Pedras Talhas.





À esquerda João Bacelar, o operador de câmara, e Panagiotis Sarantopolos (arqueólogo da Câmara Municipal de Évora), durante a recolha dos depoimentos




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